Por Natanael Moreira:
“Se levardes em conta nossas faltas, quem haverá de subsistir? Mas em vós se encontra o perdão; eu vos temo e em vós espero.” (Sl 129)
A oração do salmista, um clamor que brota das profundezas da alma, expressa a verdade universal da condição humana diante de Deus. Quando nos colocamos na presença do Senhor, o sentimento que surge em nosso coração é o reconhecimento de nossa insuficiência, de nossa incapacidade de nos sustentarmos por nós mesmos.
Vivemos, porém, em tempos de ilusória autossuficiência, tempos em que o orgulho humano constrói muralhas em torno de si e se fecha à experiência do perdão. Esquecemos que somos dependentes do amor divino. Para refletir sobre a necessidade desse amor que nos regenera, voltemo-nos a um dos episódios mais emblemáticos e reveladores das Sagradas Escrituras: o encontro de Jesus com a samaritana.
“Era preciso passar pela Samaria” (Jo 4,4) — diz o Evangelho. Um caminho improvável para um judeu fiel às suas tradições, pois entre judeus e samaritanos havia um abismo de desconfiança e ressentimentos históricos. Mas Jesus não se submete às barreiras erguidas pelo orgulho humano. Ele caminha na direção do que está distante. Ele busca quem foi esquecido. Ele se aproxima de quem tem sede e anseia por Sua presença.
Seus discípulos não compreendem. “Como pode o Mestre se dirigir a uma mulher samaritana?” Esse pode ter sido um pensamento comum entre eles. Mas Jesus não vê nisso um obstáculo. Ele sabe que, sob o peso das divisões humanas, há corações que anseiam por serem saciados.
O encontro com Jesus gera transformação. A mulher samaritana, acostumada a carregar em silêncio o peso de sua história, chega ao poço em busca de água. Mas, para sua surpresa, o próprio Deus já está ali, esperando por ela. Eis a lição que ressoa através dos séculos: é Deus quem nos busca primeiro.
“Se conhecesses o dom de Deus e quem é aquele que te diz: ‘Dá me de beber’, tu lhe pedirias, e ele te daria a água viva.” (Jo 4,10)
Aquele que se aproxima de Deus pensando em matar sua sede com a água comum encontra um manancial inesgotável de misericórdia. O Senhor nos precede no caminho da conversão. Antes que olhemos para Ele, Seu olhar já repousa sobre nós. Antes que pronunciemos uma palavra, Ele já nos chama pelo nome.
Naquele instante, a samaritana experimentou o que significa ser vista, acolhida e transformada. Seu coração, antes seco e ferido, torna-se nascente de um novo tempo. Ela, que fugia dos olhares dos outros, agora corre para anunciar o que encontrou.
“Vinde ver um homem que me disse tudo o que eu fiz! Não será ele o Cristo?” (Jo 4,29)
Assim também acontece conosco: quando nos deixamos encontrar por Deus, nossa vida se ilumina. As sombras do pecado dão lugar à luz da esperança. Cristo, Sol da Justiça, dissipa as trevas e nos conduz pelo caminho da verdade. Assim, o encontro de Jesus com a samaritana não é apenas uma história do passado, mas um convite vivo. Somos chamados a ser discípulos da misericórdia, a nos deixarmos encontrar por Ele e a levarmos essa mesma misericórdia ao mundo. O Senhor nos espera em nossos desertos, em nossos poços ressequidos. Ele nos fala da água viva. Ele nos convida à plenitude.
O que nos resta, senão abrir o coração, receber Sua graça e anunciar, como a samaritana, que nele encontramos a fonte da vida eterna?
“Ide, pois, e aprendei o que significa: Quero misericórdia e não sacrifício.” (Mt 9,13)