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A presença do Sim Maria na vida da Igreja

A presença do Sim Maria na vida da Igreja

A Mãe do Senhor mudou a história da Salvação

A alegria do amor, a resposta ao drama da tribulação e do sofrimento, a força do perdão face à ofensa recebida e a vitória da vida sobre o vazio da morte, se deve ao mistério da Encarnação (Bento XVI, Carta Apostólica, Porta Fidei, 11 de outubro, 2011, nº 12.). Pela fé, Maria acolheu a palavra do Anjo e acreditou no anúncio de que seria Mãe de Deus na obediência da sua dedicação (Lc 1, 38; Ibid., n.º 12). Maria foi do nascimento até à ressurreição (Lc 2, 19.51; At 1, 14; 2, 1-4). Por isso, desde os primórdios da Igreja ouve uma preocupação de colocar um inquirir na pessoa da Mãe de Jesus, falando de maneira específica, ou mais amplamente, num contexto teológico. Acreditamos que a Anunciação inaugura o acontecimento inédito em que o Filho de Deus se fez carne para o exímio sacrifício redentor em obediência ao Pai (Hb 10,5-10). Daqui urge falar da responsabilidade do SIM de Maria. Nossa exposição se fundamenta em teólogos sérios, edificando o que pensa a Igreja sobre o assunto. O sim de Maria acolheu a proposta divina de se humanizar e a ligou a toda humanidade. Ela possui uma função única na história da salvação: seu fiat permitiu que Deus tocasse a natureza humana. A carne de Deus pela qual se fez irmão nosso, é carne de Maria. Tais fatos não são casuais nem se esfumam no passado. Constituem-se em eventos definitivos para a história dos homens e para a história do próprio Deus. Ganham envergadura de eternidade. O amém de Maria ecoa pelos séculos a fora e continuará válido por toda a eternidade. Em setenta catequeses apresentadas no período entre 1995 e 1997, São João Paulo II inclui sempre Maria no mistério de Cristo e da Igreja: A “Obediência da fé” de Maria entronca-a diretamente com a definição de revelação-fé e com a tradição, segundo a exposição teológica-mariana de Santo Ireneu sobre Eva-Maria. A Mãe do Senhor é cume do “caminho para Deus” e “do que é impossível para o homem, mas possível para Deus”.

O Papa Francisco diz que Maria ajuda a evangelizar o povo de Deus (Cf. Teologia do Papa Francisco, 23). A fé de Maria conduz a Cristo e ao amor do Pai. O povo de Deus em caminho nota essa presença intercessora, vínculo de amor entre os crentes. Daí a presença de Maria na igreja, em suas instituições religiosas, paróquias, festas, solenidades, memórias, dioceses, no mês de maio e na igreja doméstica. De modo especial a geografia repartida dos “grandes santuários marianos” impulsa este sentido de peregrinação do povo de Deus. Maria é a chave para se captar o sentido “das coisas de Deus”, na piedade popular (DAp, n.º 264). Para o povo brasileiro, Ela representa a orientação imediata para “aceitar” e “agir” no concreto de cada dia. A Virgem é como que o traçado original da Igreja, é o “sacramento” da fidelidade a Deus e aos outros. O Cristianismo popular é “um canal de transmissão da fé” (DAp, n.º 264, in, teologia do Papa Francisco). São João Paulo II explicita a função de Maria no mistério do Verbo Encarnado recorrendo à Sagrada Escritura, argumentando o valor da Mãe de Deus na obra da Salvação. Subjaz nas palavras do Papa as que estão impressas na constituição dogmática Lumen Gentium, vale a dizer: “Quis, porém, o Pai das misericórdias que a encarnação fosse precedida pela aceitação daquela que era predestinada a ser mãe de seu Filho, para que assim como a mulher contribuiu para a morte, a mulher também contribuísse para a vida. Assim Maria, filha de Adão, consentindo na palavra divina se fez mãe de Jesus. “O nó da desobediência de Eva foi desfeito pela obediência de Maria; o que a virgem Eva ligou pela incredulidade, a virgem Maria desligou pela fé”. Comparando Maria com Eva, chamam-na de “mãe dos viventes”; e com frequência afirmam: “veio a morte por Eva e a vida por Maria” (Cf. Lúmen Gentium 52-69).

A grandeza e o significado de Maria na história da salvação dependem da graça, segundo o evangelho, porque cumpriu fielmente a vontade de Deus, no corresponder às iniciativas do alto aceita e merece a maternidade que lhe foi anunciada, ser mãe de Redentor, Cristo, Cabeça da Igreja. Maria assume o encargo de uma maternidade plena que a inclui na dimensão total do mistério de Cristo e da Igreja. A mãe do Senhor coopera com os desígnios sobrenaturais com suma disponibilidade de espirito – pia fide – merecendo então conceber e dar à luz o Filho de Deus. A atitude de Maria é determinante na regeneração e representabilidade do gênero humano, pois, através da encarnação se realizam as núpcias de Cristo com o mundo e a núpcias de Cristo com a Igreja. A Igreja começa sua caminhada histórico-salvífica no seio de Maria, nasce o Cristo total. Não se pode imaginar, a esse respeito, que Deus leve a cabo os seus desígnios de salvação à margem do “sim” iluminado pela fé de Maria. Ela se compromete a aceitar o mistério de Deus que salva. Em Maria, “nova Eva” todos estamos representados na vontade de Deus, vale a dizer, de redenção, de vida e de graça. A este respeito avultam-se as palavras de São João Paulo II: “No pronunciar o seu total “sim” ao projeto divino, Maria é plenamente livre diante de Deus. Ao mesmo tempo ela se sente pessoalmente responsável no confronto da humanidade, cujo o futuro está ligado à sua resposta”. Deus outorga às mãos de uma mulher o destino de todos. Por outras palavras, o sim de Maria assegura a realização do projeto de Deus predisposto à salvação do mundo. Por isso a “nova Eva” é a mãe daqueles que vivem em Cristo, é a toda santa, a Imaculada, desde o concebimento, como sinal de vitória final em Cristo sobre o pecado e sobre a morte.

O “sim” de Maria, a faz empreendedora, isto é, “a sempre viva para interceder a nosso favor” (Eb 7,25). A vitória da luz sobre as trevas, isto é, a vitória total de Cristo, se manifesta também em Maria a “nova Eva” a imaculada e a assunta ao Céu.
O Catecismo da Igreja Católica, ao valorizar Maria no plano divino da salvação, perfaz um resumo, sintético e eficaz, do decisivo valor em favor da humanidade do “sim” de Maria, “a Virgem Maria cooperou pela salvação do homem com liberdade tanto na fé como na obediência (CIC 489). Disse o seu fiat loco totius humanae naturae – em nome de toda a humanidade, pela sua obediência, tornou-se a Nova Eva, a mãe dos viventes” (CIC 493). O mesmo Catecismo dá a medida da extensão da Maternidade de Maria numa breve frase: “Ela é mãe em todos os domínios em que Ele (Cristo) é Salvador e Cabeça do Corpo Místico” (CIC 495-497). Esta frase pode servir de chave para resolvermos todas as dúvidas acerca das prerrogativas de Maria e das funções que desempenha na vida e na história da Igreja. Com o seu comportamento, Maria recorda a cada um de nós a grave responsabilidade de acolher o projeto divino em nossa vida. Obedecendo sem reservas à vontade salvífica de Deus, manifestada nas palavras do anjo, Maria é erigida como modelo daqueles que o Senhor proclama beatos, porque “ditosos os que escutaram a palavra de Deus e a põem em prática” (Lc 11,28). A resposta, tão espontânea de Jesus à mulher que se encontrava no meio do povo, onde esta proclama beata sua mãe, mostra o verdadeiro motivo da bem-aventurança de Maria, a adesão à vontade de Deus, que a conduziu a aceitar a divina maternidade. Na encíclica Redemptoris Mater, São João Paulo II, reforça a ideia que a nova maternidade espiritual, que Jesus fala, é precisamente aquela que está em Maria. O Papa se expressa assim: “Não é Maria a primeira entre aqueles que escutam a palavra de Deus e a colocam em prática”? (RM, 39), não olha Jesus a sua mãe quando espontaneamente dá a resposta à mulher que está no meio do povo”? Maria, é assim, num certo sentido, proclamada a primeira discípula do Filho, e com o seu exemplo, convida a todos os crentes a responderem generosamente à graça do Senhor. Na responsabilidade do seu sim, Maria se torna protótipo da Igreja, imaculada, assunta, associada a Cristo Redentor. O concílio Vaticano II, perscrutando e ilustrando a dedicação total de Maria à pessoa e à obra de Cristo, afirma: “Ofereceu-se totalmente como serva do Senhor à pessoa e obra do Filho, servindo a Ele, por graça de Deus onipotente ao mistério da redenção” (Lumen Gentium, 52-60). Aqui está explícito o empenho materno que promove o seu crescer humano na cooperação na obra da salvação. O mistério completo de Cristo, vale dizer, a realidade do Christus totus, tão profetizada por Santo Agostinho, alicerça a vida inteira de Jesus a partir da encarnação e se prolonga eternamente. Por isso, o dizer de santo Irineu testemunha a nossa conclusão, Maria obedecendo se torna causa de salvação para todo o gênero humano. Em sua figura existencial e intrínseca, existencial porque pré-vive as razões da maternidade virgem da Igreja, e intrínseca, porque determina, influi e tipifica, causa as relações maternais da Igreja-membros do Corpo místico. Como protótipo da Igreja evangelizadora, Maria, no território brasileiro, mormente na devoção mariana, é forte referência evangelizadora católica e um critério teológico simples e eficaz.

Côn. Dr. Manuel Quitério de Azevedo
Professor do Seminário Arquidiocesano de Diamantina

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