Por Farley Victor:
Deus é um eterno Amante. Quis ter um coração que palpita para ter como presente para nós, no tempo, um dom que alegremente se doa e alegremente é recebido, sem jamais cessar. Mas, para nos sentirmos recebidos nesse amor, é preciso abrirmo-nos a esse Deus que ama a cada um de nós, não porque somos perfeitos, mas porque, ao nos amar, nos torna progressivamente perfeitos em Seu amor.
Para tanto, é necessário aprendermos o amor pelo Modelo vivo que Se deu por nós e que ainda Se nos dá, que Se encarnou para que pudéssemos, com Ele, tornar presente o dom eterno que é a salvação — salvação de nosso próprio egoísmo, de tudo o que nos faz menos humanos, menos filhos do Amor.
A dor sem tamanho que experimenta o Deus que Se deixou pregar por nós na cruz revela o tamanho de Seu amor por nós; mostra-nos, com toda força, um ressoante “Eu te amo”, partindo de um Coração ferido de amor para curar o coração egoísta e ferido de cada um de nós. Quantas vezes, porém, nos fazemos surdos àquele que nos deu ouvidos? Por tanto tempo nos deixamos estar endurecidos e anestesiados, nutrindo apenas com o sangue um coração já sem vida!
Ele nos conhece antes mesmo de termos dado o primeiro respiro. Sabe de nossas fraquezas e forças, e de todos os elementos que nos fazem ser quem somos. É espantoso que um Deus que é tão perfeito e tão bom nos queira bem assim. Talvez sejamos levados a nos questionar: como pode Ele me amar? Mas a pergunta a ser feita deve referir-se menos a nós e mais a Deus mesmo: como um Deus que é amor pode não me amar? Sendo Ele a morrer por mim, sendo Ele a vir sempre a meu encontro, sendo Quem me chama pelo meu nome e não por aquilo que tenho de imperfeito…
Mas nós, quando desviados do amor, nos chamamos por aquilo que não somos, por aquilo que causa em nossos ouvidos ruídos que competem com a voz de Deus, que nos conduz a quem devemos ser. Temos as nossas fraquezas — talvez a maior delas seja não saber muito bem como ouvi-Lo. Como nos apontam as Escrituras: do coração procedem as fontes da vida (Provérbios 4,23), e a boca fala do que está cheio o coração (Mateus 12,34). Se soubéssemos fazer coro à voz de Deus que nos conclama a amar, ajudar-nos-íamos mutuamente a falar o que edifica.
Essa é a ternura das palavras de vida que nos alçam aos braços do Amor mesmo. Precisamos ser sensíveis em nosso coração para reconhecer o que aproxima ou afasta alguém do amor. Apenas assim saberemos discernir o que pode servir para o bem do irmão. Caso contrário, estaremos inoculando nele apenas o transbordar do que ainda nos é lacuna de Deus.
O Coração de Jesus, escondido na Eucaristia, pode nos ajudar a exercitar o ouvir. O “Eu te amo” divino é presença discreta e paciente em nosso dia a dia. Tudo espera, tudo suporta, por amor a nós. Mas talvez não seja de bom tom levarmos a Jesus no sacrário a imposição de nossas urgências confusas e pretensões de amor, se tivermos como horizonte a dominação desse amor como mero instrumento. Se assim nos aproximamos, longe estamos de a Ele nos achegar. Ele Se dá a nós livremente e coloca no rumo certo o nosso coração.
Seria oportuno que pedíssemos ao Cristo o perdão por nos fazermos tão lentos em ir ao Seu encontro com uma entrega confiante e amorosa da totalidade de quem somos. Poderíamos dizer assim: perdoa-nos, Senhor, Tu que nos assistes e que nos buscas em meio às brumas e abismos de nosso ser. Tu que nos encontras e nos fazes renascer todos os dias em Ti mesmo, no Teu próprio Coração, que se abre para nós como uma nova vida, onde a Trindade mesma nos recebe numa Vida sempre nova e Una no mesmo Amor.
A Tri-Unidade divina é, portanto, acolhedora. Dela podemos participar a qualquer momento graças ao Coração chagado do Cristo, como dom entregue a nós por Aquele que opera em nosso coração tanto o amor como o amar. A unidade de corações no Coração é possível a nós se, no amor de Deus, nos deixarmos perder. Com a Encarnação e o constante doar-Se do Deus que ama, podemos entrar ainda hoje na Sua Vida para render-Lhe nosso amor pessoal, num uníssono coração pelos tempos infinitos.
Autor: Farley Victor- 3° ano do Discipulado